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Sala móvel - aprender em movimento

Uma educação inovadora que não usa tecnologia e valoriza o desenvolvimento integral do ser, suas individualidades e potencialidades

Cenário brasileiro atual da educação de base

No Brasil, aos 6 anos de idade em média as crianças ingressam no Ensino Fundamental que hoje divide-se da seguinte maneira: Anos Iniciais - do 1º ao 5º ano e anos finais - do 6º ao 9º ano. O Ensino Fundamental compreende um dos níveis da Educação Básica no Brasil, é obrigatório e gratuito (nas escolas públicas). Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9395/96) define que, entre outras competências, as crianças devem desenvolver nesta etapa da vida escolar pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo.


O Indicador do Alfabetismo Funcional (INAF) criado em 2001, aponta que cerca de 38 milhões de brasileiros são considerados analfabetos funcionais, dados de 2018. O estudo realizado pelo Ibope, desenvolvido pela ONG Ação Educativa e pelo Instituto Paulo Montenegro, considera que 21% estão num patamar rudimentar e 8% são considerados analfabetos. A soma conclui, portanto, que 29% da população brasileira não tem proficiência em nosso idioma oficial. Entre os que concluíram o ensino médio, os números também são alarmantes: 13% são analfabetos funcionais e, dos que têm ensino superior, 4%. Analfabetos funcionais têm muita dificuldade em se expressar e entender informações simples por meio de números e palavras escritas. A referida pesquisa foi feita através de visitas domiciliares e testes aplicados.


A partir destes dados, configura-se a urgência do assunto: o acesso e a qualidade da educação brasileira. Ao invés de debruçar nos números, esmiuçar o panorama do nosso fracasso escolar, permito-me buscar os “Pontos de Luz”. É assim que muitos de nós educadores chamamos os lugares nos quais mesmo com todas as dificuldades, a educação segue acontecendo de maneira sólida e eficaz. Felizmente, os pontos luminosos são muitos, em diversas bases pedagógicas.


Educação para a Liberdade


Dentro de um contexto inovador bem-sucedido na educação destaco a Pedagogia Waldorf em crescimento no Brasil[1]. No ano de seu centenário, a Pedagogia criada por Rudolf Steiner na Alemanha, valoriza a corporalidade ativa, os trabalhos manuais, arte, contato com a natureza e o desenvolvimento das crianças e jovens de maneira mais integral possível. A pedagogia Waldorf almeja construir seres humanos autônomos e livres. No país, a primeira escola Waldorf foi fundada em 1956. Uma pedagogia estruturada na antroposofia e que não faz não uso de métodos apostilados e de tecnologias digitais.


São muitas as particularidades desta educação que exige dos professores uma formação específica com duração média de 3 anos e meio. As suas práticas pedagógicas levam muito em consideração o movimento, as crianças e os jovens aprendem com o corpo todo. Os estudantes pulam corda nas aulas de matemática, por exemplo. Na educação em movimento as brincadeiras e jogos dinâmicos são meios para aprender as letras e os números. Para apoiar e amplificar as possibilidades da educação em movimento é que foi criado um mobiliário pensado para facilitar as atividades.


A sala móvel – um novo paradigma para os primeiros anos do fundamental


As crianças não ficam limitadas pelas tradicionais mesas e cadeiras na sala de aula. Os móveis da sala de aula consistem em bancos, almofadas ou banquetas que muito facilmente podem ser transportados mudando completamente a configuração da sala. Rapidamente podem ser dispostos numa grande roda, ou se transformar num circuito cheio de desafios cognitivos e motores.


Segundo a Federação Brasileira de Escolas Waldorf, a primeira sala móvel no Brasil foi implementada em 2014, pela Escola a Waldorf Veredas, localizada em Campinas. Sem um número exato, a federação afirma que a cada ano surgem novas escolas Waldorf adotando a sala móvel.


O Tempo do Brincar esteve por três dias com a educadora alemã, Suzanne Stott que ministrou o curso sobre o tema na escola Waldorf Veredas. Também conversamos com Fabiana Casalecchi, professora do primeiro ano da fundamental na Escola Waldorf Jardim Primavera, em Ubatuba, que há 3 anos adotou nos 2 primeiros anos do ensino fundamental o mobiliário da sala móvel.


A sala móvel é um instrumento potente para a educação em movimento. É importante salientar que pedagogia Waldorf é permeada pelo movimento do maternal ao ensino médio. A corporalidade ativa é valorizada independente das escolas adotarem o mobiliário específico como recurso, ou não.


A professora alemã Suzanne Stoot recomenda o uso do mobiliário demostrando inúmeros benefícios. Após mais de 20 anos trabalhando com sala Móvel na Alemanha, ela acredita que as almofadas e bancos trazem muita fluidez ao movimento da sala.

A sala móvel propicia o trabalho em grupo o tempo todo, “ninguém carrega um banco sozinho”. O ritmo, isto é, os momentos de contração e expansão que acompanham o cotidiano nas escolas Waldorf se torna mais fácil e ágil. Suzanne acredita que o mobiliário traz muita saúde na vida escolar potencializando o trabalho do professor.



“Aprender é experiência, o resto é informação”.

Suzanne Stoot - professora



Para a professora Alemã, o primeiro pilar da estrutura de uma sala de aula é a rotina. Todos os dias pela manhã, em roda, as crianças têm assegurado um espaço para falar de duas emoções compartilhar e escutar. Ela cria rituais com a turma que deixam as trocas de atividade bem mais fluidas. Os trabalhos de equilíbrio, com pequenas variações diárias, os circuitos criados com todo o mobiliário acontecem todos os dias. Suzanne acredita que as crianças não devem permanecer mais de 20 minutos sentadas da mesma posição e a almofada facilita bastante a variação de postura.


Suzanne demostra as possibilidades da sala móvel juntamente com professora da EW Veredas.

Suzanne demostra as possibilidades da sala móvel juntamente com professora da EW Veredas.

Para Fabiana Casalecchi, professora da turma de 1º ano da Escola Primavera no litoral paulistano, a sala móvel traz inúmeras possibilidades físicas e acolhe o desenvolvimento do corpo etérico[2]. Segundo ela, a sala móvel reflete até mesmo nos trabalhos em aquarela trazendo mais movimento e fluidez para as pinturas de seus alunos. Em sua sala as próprias crianças ajudam na montagem dos circuitos. Nessa construção ela já trabalha o senso comunitário, a delicadeza dos gestos e a empatia. As possibilidades são muitas, Fabiana conta que com os móveis criam torres para o rei a para rainha, estrelas e grandes mesas coletivas para a hora do lanche. Um verdadeiro exercício volitivo. “As crianças entre 6 e 7 anos, ainda são essencialmente movimento. A mesa e a cadeira restringem muito a corporalidade.”

O professor lida com muitos desafios em relação a prontidão, as crianças têm um tempo para se tornarem aptas para o conteúdo da educação fundamental. Estar em bancos e almofadas exercita o equilíbrio, a ginga e o tônus muscular. Trabalha o que a antroposofia chama de sentidos básicos[3] que são: equilíbrio, tato, movimento e sentido vital. Tudo isso vai ajudar no desenvolvimento dessa prontidão. “Estamos comemorando os cem anos da criação da Pedagogia Waldorf e ainda estamos descobrindo o que Steiner propôs e quais as melhores formas de realizar. ”

“Eu acredito que a sala móvel é um presente para as crianças”.

Fabiana Casalecchi- professora

Classe do 1º ano do Fundamental EW Primavera.

Classe do 1º ano do Fundamental EW Primavera.


O Professor ou professora Waldorf, diferente das escolas tradicionais, acompanhará sua turma por muitos anos. Cabe a professora ou professor do primeiro ano do fundamental fazer com que a transição do Jardim de Infância para o Ensino Fundamental seja cheia de encantamentos, sem rompimentos radicais entre uma fase e outra. Para isso, Fabiana conta com uma indicação curricular da pedagogia Waldorf especialmente para o primeiro semestre do 1 º ano e traz para sua turma muitos elementos vindos da educação infantil como toquinhos de madeira, bonecos, tecidos e as tradicionais fadinhas artesanais. A professora usa muito um recurso amplamente usado no jardim de infância Waldorf que é o canto, até para chamar o nome dos alunos. Os cuidados com o desenvolvimento nesta educação são muitos, entre tantos pontos de luz, observar uma sala de aula de uma escola Waldorf ajuda a vislumbrar um cenário melhor para a educação brasileira.


Uma das salas móveis do ensino Fundamental da EW Veredas.

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[1] Em Matéria do jornal O Estado de S. Paulo do dia 19 de maio de 2019 informa que segundo a Federação das Escolas Waldorf do Brasil, nos últimos dez anos, o número de unidades que segue o método c processo de filiação.

[2] A antroposofia, base teórica da pedagogia Waldorf entende que o ser humano é composto por diversas organizações chamadas de corpos entre elas o corpo físico, corpo astral, a organização do eu e o corpo etérico que abrange todas as funções vitais do organismo. Assim, é tarefa do professor Waldorf estar atento ao desenvolvimento global de seus estudantes

[3] Na antroposofia os sentidos são como portais da organização humana. Nos levam às essências do mundo. A percepção humana em contato com mundo é o que nos permite entende-lo. Estes conceitos estão intimamente ligados ao papel do professor que busca educar os sentidos. Os doze sentidos para a antroposofia sã: Tato, Vital, Movimento, Equilíbrio, Olfato, Paladar, Visão, Térmico, Audição, Linguagem, Pensamento e Eu alheio.

Tempo do Brincar é um projeto pedagógico, realizado por Priscila Maranho  e mail: primaranho@gmail.com

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